Por Patricia Jacob*
Entre os 07 e 12 anos passamos por uma fase chamada ‘latência’, quando vivemos um conflito doloroso chamado “angústia de crescimento“. É o conflito entre o orgulho de crescer e se ver autônomo e o medo pela perda da segurança da infância. Na verdade revivemos esse conflito a vida toda, e não é só a criança que vive esse conflito: os pais também vivem essa angústia ao ver os filhotes ficando independentes!

Hoje li um texto de Carpinejar (poeta e escritor dos bons!), chamado “Sozinho em meus problemas“ falando de sua experiência com o filho, e achei tão bom que não teria palavras mais claras pra mostrar a vocês do que se trata a tal angústia! Então quis transcrevê-lo aqui nesse espaço. Tenho certeza de que todo pai e mãe passam por algo assim em algum momento… rs

Vamos ao texto: “(…) O banheiro do avião me convenceu de algumas bobagens paternas. A mania de controlar o filho. Controlar é dominar. Dominar é ter poder. Ao pai, resta influenciar. Outras formas de autoridade envolvem submissão. Dar exemplo é para quem não deu amor. (…) No avião, meu menino sentou na janela. (…) De repente Vicente diz que vai ao banheiro. Eu sigo em seu encalço. Não confio que ele é capaz de ir ao banheiro sozinho. Esqueço que está na 2ª série. Parto atrás, ele fecha a porta na minha cara.

Aflito, retorno às incertezas. Observo o visor: ele botou a tranca do sanitário. Trancou-se, e agora? Um homezinho em cor vermelha. Vermelha de perigo. Se ele não souber abrir, se não achar o papel, se não assimilar o mecanismo de esguicho da água, se não localizar a descarga, se ele cair com o balanço da nave e bater a cabeça… Nenhuma das hipóteses me assustava tanto quanto o provável fato dele acertar todos os movimentos. Cuidei minuto a minuto de sua ausência. (…) Ele estava demorando. Não fui cauteloso. Não fui previdente. Deveria acatar os pressentimentos ruins e tomar uma atitude. As pálpebras estalavam como chicotes. A culpa e o castigo contaminam a paternidade. Xingamos a criança porque sofremos em demasia na nossa imaginação.

Brigamos muitas vezes sem que ela decifre o que fez de errado. Ela não fez nada de errado, nós é que cogitamos tudo de errado que poderia acontecer com ela. E explodimos. Descarregamos um revólver vazio. Entenda, não estava preocupado com ele, mas comigo, ele não dependia mais de mim.

Quando o carrinho libertou meu assento, levantei. Ao dar o primeiro passo, ele abriu a porta e veio me abraçar. Simulei que me levantei para que gentilmente voltasse ao seu lugar. Vicente é mais resolvido do que eu – sofro de prisão de ventre e tenho vergonha de usar banheiro que não o de minha casa.“

Patricia Jacob é psicóloga clínica formada pela USP-SP.

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